Unidade da Fundação Casa na Zona Norte de SP fecha as portas após denúncias de violência e omissão


Em dois episódios, em janeiro e fevereiro deste ano, funcionários da unidade foram acusados de agressão e prevaricação contra adolescentes infratores. Instituição diz que unidade foi fechada por uma ‘readequação planejada’. Jovens e servidores foram transferidos. Fundação Casa unidade Paulista, na Zona Norte de SP
Reprodução/Google Street View
A unidade Paulista da Fundação Casa, no Complexo da Vila Maria, na Zona Norte de São Paulo, fechou as portas na sexta-feira (7) após denúncias de violência e prevaricação contra funcionários. Os adolescentes infratores e servidores foram transferidos para outras unidades (leia mais abaixo).
No final de fevereiro, familiares relataram que, após uma briga, alguns adolescentes sofreram queimaduras. As mães dos internos afirmaram que, embora os jovens possam ter iniciado o fogo, elas tiveram acesso a imagens que mostrariam a direção da unidade arremessando objetos em chamas contra os adolescentes.
Após o incidente, ainda segundo a denúncia, os internos não receberam atendimento médico adequado. Um deles, com queimaduras graves, só foi encaminhado ao hospital dois dias depois, enquanto outros nem sequer teriam recebido pomadas para queimaduras, de acordo com relatos.
A denúncia foi encaminhada ao juiz da Vara da Infância e Juventude e também à Defensoria Pública, que repassou o caso ao juiz corregedor.
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Em nota ao g1, a Fundação Casa afirmou que as câmeras de segurança registraram todas as ações ocorridas no último dia 21 e negou que agentes tenham ateado fogo em adolescentes.
Segundo a instituição, as imagens mostram que nove internos iniciaram um tumulto ao pegar fios elétricos de um dormitório para gerar faíscas e incendiar um colchão, que foi arrastado para o pátio quando a porta foi aberta. Durante a confusão, os jovens teriam rendido servidores e danificado móveis da unidade.
A direção afirma que a equipe interveio para conter a situação, seguindo os protocolos de segurança. Três servidores sofreram escoriações leves, um adolescente teve um corte na cabeça e outro apresentou queimadura no braço, supostamente causada pelo fogo iniciado pelos próprios internos, de acordo com a instituição. A Fundação Casa garante que todos os envolvidos receberam atendimento imediato da equipe de enfermagem e foram levados ao pronto-socorro, sendo liberados no mesmo dia.
A Corregedoria Geral da Fundação Casa instaurou um procedimento interno para apurar o caso, enquanto os adolescentes envolvidos passam por avaliação disciplinar.
Outra agressão
Em 19 de janeiro, em outro episódio, um adolescente de 17 anos foi agredido. Ele foi socorrido e encaminhado a um hospital municipal, mas os funcionários da instituição comunicaram a polícia apenas no dia 21, dois dias após o ocorrido.
Segundo o que foi apurado pelo g1, o adolescente foi agredido por outros seis internos — entre adolescentes e maiores de idade que ainda cumprem medida socioeducativa — em um momento em que estavam sem supervisão dos funcionários da unidade.
Ele teria sido encontrado desacordado e encaminhado ao Hospital Municipal Vereador José Storopolli, também na Zona Norte.
Procurada pelo g1, a Fundação Casa nega a versão. Diz que o adolescente foi prontamente atendido pela equipe de enfermagem da unidade “após ser encontrado desmaiado por um agente da unidade”. Após análise preliminar, a instituição afirma que o caso teria sido tratado como uma questão de saúde e que a corregedoria instaurou uma sindicância interna para apurar os fatos e adotar as medidas cabíveis (leia a íntegra abaixo).
Segundo uma fonte ouvida pelo g1, funcionários da Fundação Casa chegaram a dizer no hospital que o adolescente havia sido agredido. Mas depois, em depoimento à polícia, um funcionário da entidade afirmou que o interno teve um mal súbito na sala de TV.
No entanto, o 19º Distrito Policial (DP), Vila Maria, que investiga o caso, considera a possibilidade de agressão entre os adolescentes, tanto que um deles está sendo investigado por ato infracional análogo ao crime de lesão corporal.
Em razão disso, funcionários da Fundação Casa estão sendo investigados pelo crime de prevaricação por conta de duas situações: pela possível falta de vigilância em relação aos internos e por terem comunicado o fato apenas dois dias após o ocorrido.
Segundo o Código Penal, a prevaricação acontece quando um funcionário público demora ou deixa de fazer algum ato de sua responsabilidade. A pena varia de três meses a um ano.
O g1 apurou que a investigação está em andamento com a oitiva de todas as partes envolvidas e que a polícia analisa imagens das câmeras de segurança da unidade.
Em nota, a Secretaria da Segurança Pública (SSP) informou que o 19º DP instaurou um inquérito policial para investigar todas as circunstâncias relativas ao caso e que outros detalhes serão preservados.
Fechamento da unidade
O atendimento na unidade Casa Paulista foi encerrado na última sexta (7) “como parte de uma readequação planejada, decorrente da redução no ingresso de adolescentes no sistema socioeducativo desde 2019”, explicou a fundação.
“A medida tem como objetivo aprimorar as condições de atendimento, garantindo maior eficiência na gestão das unidades.”
“A unidade operava com 19 adolescentes, o que representava apenas 37% de sua capacidade. Diante desse cenário, os jovens foram transferidos para os outros centros socioeducativos em funcionamento na capital e em Osasco, respeitando a disponibilidade de vagas e as preferências individuais. Todo o processo foi acompanhado pelas famílias, que foram devidamente informadas”, diz a instituição.
Apesar disso, familiares disseram ao g1 que adolescentes foram transferidos para unidades no litoral paulista e que só depois foram avisados.
Atualmente, a Fundação Casa mantém 96 centros socioeducativos em operação.
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