
São apenas 23 delegacias pelo RS, o que representa 4,6% de todos os 497 municípios gaúchos. Secretaria da Segurança Pública não se manifestou. Falta de estrutura e efetivo nas delegacias da mulher
O Rio Grande do Sul sofre com o baixo número de delegacias especializadas no atendimento à mulher (DEAMs). As unidades ligadas à Polícia Civil estão presentes em apenas 23 cidades do estado, o que representa 4,6% de todos os 497 municípios gaúchos, segundo apuração da RBS TV, com base em dados disponibilizados pela Polícia Civil RS.
Além da falta de delegacias especializadas, também faltam delegadas responsáveis em algumas unidades. É o caso de Alvorada, na Região Metropolitana, que não tem uma autoridade policial titular há mais de um ano. Desde então, o serviço é feito por policiais de outras unidades, em sistema de revezamento.
Em Esteio, também na Região Metropolitana, uma delegacia da mulher foi inaugurada sem ter uma delegada titular. O trabalho é feito pela delegada de Canoas, cidade vizinha. Quando ela sai de férias, uma outra delegada fica responsável pelas duas delegacias da mulher além da sua própria unidade distrital.
O presidente da Associação dos Delegados de Polícia, Guilherme Yates Wondracek, explica que, além da falta de delegacias especializadas, o número de policiais é baixo nas poucas que existem.
“Nós temos hoje, em 2025, um efetivo inferior a 1980, quando tínhamos 244 municípios, hoje temos 497. A criminalidade aumentou exponencialmente (…) e o efetivo é bem menor que há 45 anos atrás. Os policiais trabalham sobrecarregados, porque são poucos, não são valorizados e muitos deles pedem para sair”, lamenta.
Em Erechim e Rio Grande, o governo do estado decidiu transformar as delegacias da mulher em delegacias de Proteção à Grupos Vulneráveis (DPGV), responsável também por investigações de crimes contra idosos, crianças e adolescentes e casos de preconceito racial ou religioso.
O Sindicato dos Policiais Civis (UGEIRM) explica que os relatos que chegam dos agentes é de que a pressão aumentou.
“O trabalho na DEAM é supercomplexo, não pode ter nenhuma falha, qualquer erro de um policial pode resultar na morte de uma mulher”, conta Fabio Castro, vice-presidente do Sindicato dos Policiais Civis.
A RBS TV ainda apurou que três delegacias da mulher são comandadas por homens: é o que ocorre nas DEAMs em Novo Hamburgo, Ijuí e Cruz Alta.
Segundo a Lei 14.541/23, todas as Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (Deam) devem funcionar ininterruptamente.
Reprodução/RBSTV
Falta estrutura no Interior
A falta de estrutura se repete em todo o estado. Segundo a Polícia Civil, apenas a delegacia da capital funciona 24 horas por dia, conforme exigido por lei.
De acordo com a Lei 14.541/23, todas as Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (Deam) devem funcionar ininterruptamente, 24 horas por dia, todos os dias da semana, incluindo finais de semana e feriados.
No entanto, há ainda regiões inteiras sem nenhuma unidade especializada. No Litoral Norte, não há uma única DEAM. Entre Guaíba, Região Metropolitana e São Lourenço do Sul, no Centro-Sul, também não.
Parobé, cidade mais populosa do Vale do Paranhana, está sem. Na Fronteira Oeste, só Uruguaiana tem uma delegacia da mulher — nada em São Gabriel ou Alegrete.
Crise na polícia
As denúncias e a demora no atendimento levaram a uma crise entre polícia e governo. O então chefe de polícia, Fernando Sodré, foi exonerado. O diretor do Departamento de Grupos Vulneráveis, Cristian Nedel, também caiu. E a delegada Cristiane Ramos, que chefiava a Divisão de Proteção à Mulher, pediu exoneração alegando assédio moral e pressão interna.
A nova diretora, Tatiana Bastos, afirma que medidas já estão sendo adotadas para melhorar o serviço em Porto Alegre — onde a situação é mais crítica por conta do volume de atendimentos.
“Percebemos que faltava gestão. Reorganizamos as escalas e agora temos cinco servidores por dia em turnos de 12 horas. Instalamos também um terminal de registros para casos sem risco imediato à vida. Mas é importante não desqualificar o trabalho da Deam”, diz.
Ela reforça que a delegacia da mulher é, em muitos casos, a única porta aberta para mulheres em situação de violência.
“Temos problemas estruturais, sim. Mas atacar o órgão é um desserviço. Precisamos fortalecer essas instituições, não enfraquecê-las”, comenta.
O g1 procurou o novo chefe de polícia, Heraldo Guerreiro, mas ele está em férias. O secretário da Segurança Pública, Sandro Caron, foi chamado a comentar o número reduzido de delegacias e policiais, mas o governo respondeu que as dúvidas poderiam ser respondidas pela nova diretora da Divisão de Proteção à Mulher — que, no entanto, não tem atribuição sobre efetivo e estrutura fora da capital.
Junto à Polícia Civil, existem delegacias especializadas no atendimento à mulher.
Reprodução/RBSTV
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