Os bastidores do conclave por um cardeal que já esteve em um; spoiler: ele diz não haver ‘conspiração política’


‘Durante todo o processo, tivemos uma consciência muito clara de que milhões de católicos ao redor do mundo estavam rezando por nós para que o Espírito Santo nos guiasse em nossas deliberações’, diz o cardeal americano Sean O’Malley, que participou do conclave que elegeu Francisco. Freira Geneviève Jeanningros se aproxima do caixão do papa Francisco
Alessandro Di Meo via AP
Esqueça — até certo ponto — o que você pode ter aprendido com “Conclave”, o filme que retrata jogos de poder de alto nível e traições entre clérigos de túnica vermelha.
O Vaticano se prepara para a reunião secreta dos cardeais que escolherão o sucessor do papa Francisco. O conclave dos chamados “Príncipes da Igreja” deve começar entre 6 e 11 de maio, após o funeral de Francisco no sábado (26) e um período de consultas entre os cardeais, conhecidas como congregações gerais.
O filme, que ganhou um Oscar em março de melhor roteiro adaptado, é uma representação fiel em termos de figurino e encenação, mas o esquema descarado e o desenlace final são exagero não retratam a realidade — embora de fato haja algumas semelhanças—, dizem especialistas da Igreja.
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O cardeal americano Sean O’Malley, franciscano que participou do conclave de 2013 que elegeu o papa Francisco, afirmou que eleger um papa não é “algum tipo de cena de conspiração política nos bastidores sobre como eleger seu candidato”.
“Durante todo o processo, tivemos uma consciência muito clara de que milhões de católicos ao redor do mundo estavam rezando por nós para que o Espírito Santo nos guiasse em nossas deliberações”, disse O´Malley.
No conclave, os cardeais reunidos dentro da Capela Sistina estão proibidos de se comunicar com o mundo exterior — como o uso de telefones, televisão ou internet — e devem ficar em silêncio sobre a eleição depois do processo. Mas os detalhes, inevitavelmente, acabam passando despercebidos.
O próprio Francisco, em um livro de entrevistas publicado no ano passado, quebrou a regra de confidencialidade e admitiu que houve algumas maquinações.
“Os cardeais juram não revelar o que acontece no conclave, mas os papas têm licença para contá-lo”, disse ele ao jornalista espanhol Javier Martinez-Brocal.
Ele disse ter sido “usado” em uma tentativa fracassada de bloquear Bento XVI, o favorito em 2005, com 40 dos 115 votos convergindo para ele, já que os cardeais por trás da manobra esperavam que isso abrisse caminho para o surgimento de outro candidato.
Segundo Francisco, Bento XVI, que depois foi eleito disse a um dos conspiradores: “Não brinque comigo, porque agora mesmo vou dizer que não vou aceitar (o esquema proposto), ok? Me deixe de fora disso”.
O papa Francisco disse que votou pessoalmente em Bento XVI porque a Igreja precisava de um “papa de transição” após o longo papado de João Paulo II. Depois, em 2013, o próprio Francisco surgiu como candidato surpresa, após impressionar seus pares com um discurso sobre a necessidade de reforma da Igreja.
“Vamos encarar a realidade: ‘Conclave’, que nos leva ao coração de um dos eventos mais misteriosos e secretos do mundo, é apenas um filme muito divertido. Mas é impossível não sorrir diante de certos personagens ou situações que, principalmente aos olhos dos espectadores italianos, correm o risco de parecer paródias involuntárias”, escreveu o jornal dos bispos italianos, Avvenire, em uma crítica de dezembro.
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Desta vez, não há um favorito claro, embora as casas de apostas britânicas tenham nomeado Luis Antonio Tagle, um reformador das Filipinas, e Pietro Parolin, uma escolha de compromisso da Itália, como os mais cotados.
Robert Harris, autor do livro no qual o filme “Conclave” é baseado, disse ao jornal “The Boston Globe” esta semana que abordou o conclave “puramente de um ponto de vista secular de alguém interessado em instituições, como elas funcionam e os jogos de poder dentro delas”.
“Essas figuras poderosas estão trancadas em uma das joias artísticas mais extraordinárias do Renascimento. Elas não têm permissão para falar com o mundo exterior e precisam ficar lá por dias até obterem a maioria de dois terços, e isso é simplesmente o drama mais maravilhoso em si”, acrescentou.
Já o diretor de “Conclave”, Edward Berger, disse que, embora o filme se passe no Vaticano, ele poderia ser sobre os jogos de poder que acontecem onde quer que haja um cargo importante a ser preenchido.
“E sempre que esse vácuo de poder existir, haverá pessoas lutando por ele. Haverá pessoas lutando por ele, apunhalando-se mutuamente pelas costas e tentando manipular seu caminho para chegar a esse poder”, disse ele à Reuters em novembro.
Independentemente de quanto o livro e o filme sejam ficção, o interesse pela história aumentou depois que o papa Francisco morreu, na segunda-feira (21). A empresa de dados da indústria do entretenimento Luminate relatou que os números de audiência “Conclave” aumentaram 283% na segunda-feira, em comparação com a semana anterior.
Funeral do papa Francisco
O Vaticano anunciou que o funeral do papa Francisco será às 5h de sábado (26), 10h no horário local de Roma.
Nesta quarta-feira (23), o caixão com o corpo do pontífice foi trasladado da Capela de Santa Marta para a Basílica de São Pedro nesta quarta-feira (23) às 4h no horário de Brasília, às 9h no horário local, e ficará exposto para homenagens do público.
O traslado terá procissão que passará pela Praça Santa Marta e pela Praça dos Protomártires Romanos, sairá pelo Arco dos Sinos em direção à Praça de São Pedro e entrará na basílica pela porta central.
O funeral de Francisco será cercado por uma série de cerimônias da Igreja Católica para se despedir do pontífice. Mais cedo, o Vaticano havia informado que a cerimônia ocorreria entre sexta-feira (25) e domingo (28).
Francisco morreu aos 88 anos na segunda-feira (21). O Vaticano informou que o papa sofreu um Acidente Vascular Cerebral (AVC), seguido de um quadro de insuficiência cardíaca irreversível.
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