
Serviço de assessoria tributária ilegal era oferecido quando a vítima indicava o negócio que pretendia fazer. Entre os investigados estão o procurador da Assembleia Legislativa de Goiás e um auditor fiscal da Secretaria da Economia. Procurador da Alego é preso em operação da Polícia Civil contra corrupção, em Goiás
Divulgação/Polícia Civil
As vítimas do esquema de fraude no Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) eram abordadas em cartório, informou o delegado Bruno Barros Ferreira. O esquema movimentou cerca de R$ 350 milhões durante cinco anos, com base em uma assessoria tributária ilegal, que consistia na falsificação de documentos, segundo a Polícia Civil.
“Assim que o contribuinte chegava e anunciava que gostaria de fazer aquele determinado negócio, a associação criminosa comunicava essa associação e ela interceptava esse potencial contribuinte para que ele se convencesse a contratar assessoria tributária com a promessa de que ele pagaria muito menos”, explicou o delegado.
Na terça-feira (20), a Polícia Civil prendeu cinco pessoas suspeitas de fazer parte da organização. Os presos são um procurador da Assembleia Legislativa de Goiás, um auditor fiscal da Secretaria da Economia, uma tabeliã e seu marido, além de uma advogada de Goiânia. O g1 entrou em contato com o delegado para saber se os suspeitos continuam presos nesta sexta-feira (23), mas não obteve retorno até a última atualização desta reportagem.
Segundo a investigação, a Polícia Civil identificou 15 vítimas do esquema, sendo que uma delas relatou ter tido um prejuízo de R$ 17 milhões. O valor cobrado pela falsa assessoria tributária não foi divulgado.
O outro lado
Como os nomes dos investigados não foram divulgados, o g1 não conseguiu localizar a defesa deles.
Ao g1, a Assembleia Legislativa afirmou não ter conhecimento sobre a operação. “A Alego não se responsabiliza por qualquer ato ilícito cometido por qualquer um dos servidores que não tenha relação com a administração legislativa”, pontuou (leia o pronunciamento ao final do texto).
A Secretaria da Economia informou, por meio de nota, que “aguarda informações sobre a apuração e seus desdobramentos e poderá adotar as providências cabíveis também na esfera administrativa”.
Já a Ordem dos Advogados Seção Goiás (OAB-Goiás) disse que está acompanhando o caso. “A Seccional reitera que acompanha todas as situações que chegam ao seu conhecimento, adotando as providências cabíveis para resguardar a dignidade da advocacia”, destacou o texto (leia na íntegra ao final do texto).
Em nota, Sindicato dos Funcionários do Fisco do Estado de Goiás (Sindifisco-GO) informou que aguarda atualização das investigações e que confia na condução do processo legal, assim como na presunção da inocência do auditor.
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Como funcionava o esquema
Os investigados são suspeitos de abordar as vítimas em cartórios para prestar um serviço de assessoria tributária, com o pretexto de reduzir o imposto em casos de heranças ou doação de bens. A associação conseguia acessar os dados das vítimas no sistema da Receita Estadual e identificar quais eram os contribuintes que deveriam recolher tributos com valores muito altos.
Para dar credibilidade ao esquema, eram marcadas reuniões com os contribuintes dentro da Assembleia Legislativa. Os envolvidos falsificavam os demonstrativos de cálculo do ITCMD, reduzindo a alíquota.
“Eles falsificavam o demonstrativo de cálculo […] Eles alteravam a alíquota [antes de 8%], às vezes a colocando 1% ou inferior a 1%. Eles reduziam falsamente a alíquota a partir da edição do documento e o respectivo valor”, destacou o investigador.
As vítimas, sem suspeitar da fraude, realizavam o pagamento. O delegado responsável pela investigação explicou que algumas pessoas nem sequer sabem que foram lesadas pelo esquema. “Elas acreditavam porque essa associação criminosa contava com elementos concretos de convencimento, como, por exemplo, a participação de um procurador da Assembleia Legislativa”, ressaltou Bruno.
Por conta disso, o delegado contou que, quando as vítimas eram autuadas pela Receita, elas eram convidadas a pagar a diferença ou o valor real que não havia sido recolhido, porque no sistema constava em aberto. “A vítima tende a acreditar que foi um simples problema na prestação de serviço da assessoria tributária”, disse o delegado.
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Divulgação/Polícia Civil
Investigação
O esquema é investigado pela Operação Prince John, que foi deflagrada em setembro de 2024. O delegado Bruno informou que, mesmo diante das investigações, os suspeitos continuaram com a fraude.
“Eles transacionaram, em cinco anos, aproximadamente R$ 350 milhões através de suas contas físicas e pessoas jurídicas, e apenas entre eles, R$ 4 milhões”, destacou o delegado.
Neste mês de maio, a operação está na segunda fase, na qual foram apreendidos aproximadamente R$ 190 mil, além de um veículo e diversas joias, somente na casa do procurador.
Na operação, foram cumpridos ao todo 15 mandados de busca e apreensão nas cidades de Goiânia, Acreúna, Edéia, Paraúna e Goianésia. Além disso, mais de R$ 5,3 milhões foram sequestrados.
Segundo a polícia, o grupo está sendo investigado pelos seguintes crimes:
Associação criminosa
Corrupção ativa
Corrupção passiva
Estelionato
Extorsão
Falsificação de documento público
Falsidade ideológica
Uso de documento falso
Nota da defesa do procurador
O advogado responsável pela defesa técnica do Advogado e Procurador da Assembleia Legislativa do Estado de Goiás, esclarece que seu cliente nega veementemente os fatos que lhe são atribuídos e que não conhece as pessoas que foram presas nesta ocasião.
Esclarece, ainda, que seu cliente nunca foi ouvido sobre os fatos apurados. Tivesse sido, por certo, teria condições de esclarecer e evidenciar a inexistência de qualquer fato ilícito praticado. E ainda, que os valores por si recebidos são inerentes a recebimento de honorários advocatícios por serviços devidamente prestados, conforme se comprovará em Juízo.
Por fim, registra que acessou há pouco o processo e que entende inexistirem elementos concretos que evidenciam a necessidade da prisão temporária decretada, a qual espera ser revogada, uma vez que todas as provas foram colhidas e as diligências investigativas cumpridas, conforme comunicação da AUTORIDADE POLICIAL.
Nota da Assembleia Legislativa de Goiás
A Assembleia Legislativa de Goiás não tem conhecimento da operação da Polícia Civil que investiga um dos servidores da Casa. A Alego não se responsabiliza por qualquer ato ilícito cometido por qualquer um dos servidores que não tenha relação com a administração legislativa. A Assembleia Legislativa de Goiás reprova veementemente este tipo de conduta e está à disposição da Polícia Civil e dos órgãos competentes para colaborar com as investigações.
Secretaria de Comunicação da Assembleia Legislativa de Goiás
Nota da OAB-Goiás
A Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Goiás (OAB-GO), por meio do Sistema de Defesa das Prerrogativas (SDP) e da subseção de Goianésia, informa que está acompanhando a segunda fase da operação Prince Jonh, que apura supostas fraudes no recolhimento do Imposto sobre a Transmissão Causa Mortis e Doação de Quaisquer Bens ou Direitos (ITCD), envolvendo três advogados.
A Seccional reitera que acompanha todas as situações que chegam ao seu conhecimento, adotando as providências cabíveis para resguardar a dignidade da advocacia. Esse acompanhamento é pautado na defesa das prerrogativas profissionais, com atenção rigorosa aos preceitos éticos que regem o exercício da advocacia.
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