Grupo Pife Muderno expõe a face mais vivaz da obra lapidar de Edu Lobo em álbum com 13 músicas do compositor


A presença de Hermeto Pascoal em duas faixas valoriza o disco produzido e arranjado por Carlos Malta. Capa do ‘Edu Pife’, de Carlos Malta & Pife Muderno
Arte de Leilene Mota
♫ OPINIÃO SOBRE DISCO
Título: Edu Pife
Artista: Carlos Malta & Pife Muderno
Cotação: ★ ★ ★ ★ 1/2
♬ Construída com requinte singular que roça a perfeição da música erudita, a obra lapidar de Edu Lobo costuma seduzir mais os ouvintes pela força de canções densas como Pra dizer adeus (1966, com versos de Torquato Neto), Beatriz (1983), Sobre todas as coisas (1983), Choro bandido (1985) e Valsa brasileira (1988) – as quatro últimas escritas por Lobo ao longo da década de 1980 com letras de Chico Buarque para trilhas de balés e musicais de teatro.
Contudo, o cancioneiro do compositor carioca também tem face vivaz, de sabor regionalista, geralmente nordestino, reflexo da influência dos baiões e frevos ouvidos por Edu Lobo quando ele passava férias em Pernambuco, absorvendo a herança musical da terra do pai, o compositor e jornalista Fernando Lobo (1915 – 1996).
É essa vertente que sobressai em Edu Pife, álbum que será lançado amanhã, 11 de fevereiro, com capa assinada por Leliene Rosa e com abordagens de 13 músicas do compositor pelo Pife Muderno, grupo fundado pelo músico carioca Carlos Malta com mix de flautas, pífanos e percussões.
Ás dos instrumentos de sopros, Malta se viu tocado pela música de Edu Lobo quando, aos sete anos, viu o artista personificar um cantador e violeiro na defesa do moderno baião Ponteio em histórico festival de 1967. Decorridos 58 anos, Carlos Malta e Pife Muderno sopram a sofisticação do cancioneiro atemporal de Edu Lobo em disco formatado no estúdio da gravadora Biscoito Fino, no Rio de Janeiro (RJ), sob a direção musical do próprio Carlos Malta, autor dos arranjos.
Curiosamente, Ponteio não figura no repertório, mas estão lá o serelepe Frevo diabo (1988), tema da parceria com Chico Buarque que no disco parece tocado por banda de pífanos em Caruaru (PE) ou em outras cidades do sertão pernambucano, assim como Na carreira (1983), mais uma obra-prima da parceria de Edu com Chico.
Edu Lobo (de óculos) posa com o grupo Pife Muderno na gravação do álbum ‘Edu pife’
Marian Starosta / Divulgação
Ninguém canta as letras das músicas neste disco essencialmente instrumental e, por isso mesmo, a lembrança de A história de Lily Braun (1983) tira a graça da música ao omitir os versos escritos por Chico Buarque em perfeita sintonia com a atmosfera de cabaré da composição.
Em contrapartida, o álbum Edu Pife ganha força quando abre espaço para os vocalizes do próprio Edu Lobo e do cantor Matu Miranda em três músicas – Água verde (1970), Casa forte (1968) e Zanzibar (1970). A arquitetura de Casa forte balança, mas não cai, com as inventivas intervenções percussivas e vocais de Hermeto Pascoal, músico convidado que também dá direção livre a Vento bravo (1973).
Com medley que agrega Uma vez um caso (Edu Lobo e Cacaso, 1976) e Viola fora de moda (1973), o álbum Edu Pife marca a estreia do percussionista maranhense Fofo Black (caixa, pratos e berimbau) no grupo Pife Muderno. Sob a liderança de Carlos Malta (sax soprano e triângulo), Black se junta a Andrea Ernest Dias (flautas e pífanos), Bernardo Aguiar (Pandeiros, sementes), Durval Pereira (zabumba, reco-reco, pandeiro) e Marcos Suzano (cuíca e pandeiro).
Com justificável reverência ao cancioneiro de Edu Lobo, o Pife Muderno apresenta álbum que se legitima desde o início no clima lúdico de Abertura do Circo (Edu Lobo e Chico Buarque, 1983) e se mantém com vigor em rota que abarca a cadência do samba em Lero lero (Edu Lobo e Cacaso, 1978) – faixa em que se ouve o choro da cuíca de Suzano – e passa pela aridez moura de Repente (Edu Lobo e José Carlos Capinan, 1976), tema nordestino levado nas flautas e nos pífanos, até cair em Bate boca (Edu Lobo e Paulo César Pinheiro, 1991), faixa embasada pelo toque dos pandeiros, mesmo quando o ritmo se intensifica no minuto final da gravação.
Enfim, como o cancioneiro de Edu Lobo nunca foi muderno, e sim eterno, a obra mais vivaz do compositor se afina com o Pife neste ótimo álbum.
Carlos Malta (à esquerda) com Edu Lobo, que participa de três faixas do álbum ‘Edu Pife’
Maria Mazzillo / Divulgação
Adicionar aos favoritos o Link permanente.